sexta-feira, 27 de maio de 2016

TODOS PENSAM DE FORMA...



....diferente e muitas vezes efémera


 Cada indivíduo vê o mundo - e o que este tem de acabado, de regular, de complexo e de perfeito - como se se tratasse apenas de um elemento da Natureza a partir do qual tivesse que constituir um outro mundo, particular, adaptado às suas necessidades.
 Os homens mais capazes tomam-no sem hesitações e procuram na medida do possível comportar-se de acordo com ele. Há outros que não se conseguem decidir e que ficam parados a olhar para ele. E há ainda os que chegam ao ponto de duvidar da existência do mundo.
 Se alguém se sentisse tocado por esta verdade fundamental, nunca mais entraria em disputas e passaria a considerar, quer as representações que os outros possam fazer das coisas, quer a sua, como meros fenómenos. Porque de facto verificamos quase todos os dias que aquilo que um indivíduo consegue pensar com toda a facilidade pode ser impossível de pensar para um outro. E não apenas em relação a questões que tivessem uma qualquer influência no bem estar ou no sofrimento das pessoas, mas também a propósito de assuntos que nos são totalmente indiferentes.



 Johann Wolfgang von Goethe, in 'Máximas e Reflexões



E o problema maior do mundo reside precisamente na incapacidade do ser humano aceitar e respeitar a individualidade de cada um

Emilia Pinto



segunda-feira, 16 de maio de 2016

POLITICA DE INTERESSE




( foto do google )

...e consequentemente MUITO CORRUPTA


Em Portugal não há ciência de governar nem há ciência de organizar oposição. Falta igualmente a aptidão, e o engenho, e o bom senso, e a moralidade, nestes dois factos que constituem o movimento político das nações. A ciência de governar é neste país uma habilidade, uma rotina de acaso, diversamente influenciada pela paixão, pela inveja, pela intriga, pela vaidade, pela frivolidade e pelo interesse.
 A política é uma arma, em todos os pontos revolta pelas vontades contraditórias; ali dominam as más paixões; ali luta-se pela avidez do ganho ou pelo gozo da vaidade; ali há a postergação dos princípios e o desprezo dos sentimentos; ali há a abdicação de tudo o que o homem tem na alma de nobre, de generoso, de grande, de racional e de justo; em volta daquela arena enxameiam os aventureiros inteligentes, os grandes vaidosos, os especuladores ásperos; há a tristeza e a miséria; dentro há a corrupção, o patrono, o privilégio. A refrega é dura; combate-se, atraiçoa-se, brada-se, foge-se, destrói-se, corrompe-se. Todos os desperdícios, todas as violências, todas as indignidades se entrechocam ali com dor e com raiva.
 À escalada sobem todos os homens inteligentes, nervosos, ambiciosos (...) todos querem penetrar na arena, ambiciosos dos espectáculos cortesãos, ávidos de consideração e de dinheiro, insaciáveis dos gozos da vaidade.


 Eça de Queiroz, in 'Distrito de Évora (1867 )


Não é só na politica que a CORRUPÇAO existe; ela vê-se por todo o lado e em todos os aspectos da vida social
Muitos actos praticados por nós são pequenas acões corruptas, embora nos pareçam normais e inofensiveis.


Emilia Pinto

quinta-feira, 5 de maio de 2016

AMÁLIA CANTA....





....A TROVA DO VENTO QUE PASSA

Pergunto ao vento que passa
 notícias do meu país
 e o vento cala a desgraça
 o vento nada me diz.

 Pergunto aos rios que levam
 tanto sonho à flor das águas
 e os rios não me sossegam
 levam sonhos deixam mágoas.

 Levam sonhos deixam mágoas
 ai rios do meu país
 minha pátria à flor das águas
 para onde vais? Ninguém diz.

 Se o verde trevo desfolhas
 pede notícias e diz
 ao trevo de quatro folhas
 que morro por meu país.

 Pergunto à gente que passa
 por que vai de olhos no chão.
 Silêncio - é tudo o que tem
 quem vive na servidão.

 Vi florir os verdes ramos direitos
 e ao céu voltados.
 E a quem gosta de ter amos
 sempre os ombros curvados.

 E o vento não me diz nada
 ninguém diz nada de novo.
 Vi minha pátria pregada
 nos braços em cruz do povo.

 Vi meu poema na margem dos rios
 que vão pró mar
 como quem ama a viagem
 mas tem sempre de ficar.

 Vi navios a partir (Portugal à flor das águas)
 vi minha trova florir (verdes folhas verdes mágoas).
 Há quem te queira ignorada
 e fale pátria em teu nome.


 Eu vi-te crucificada
 nos braços negros da fome.
 E o vento não me diz nada
 só o silêncio persiste.

 Vi minha pátria parada
 à beira de um rio triste.
 Ninguém diz nada de novo
 se notícias vou pedindo nas mãos vazias do povo
vi minha pátria florindo

. E a noite cresce por dentro
 dos homens do meu país.
 Peço notícias ao vento
 e o vento nada me diz.

 Mas há sempre uma candeia
 dentro da própria desgraça
 há sempre alguém que semeia
 canções no vento que passa.

 Mesmo na noite mais triste
 em tempo de servidão
 há sempre alguém que resiste
 há sempre alguém que diz não.

 Manuel Alegre, in 'Praça da Canção'

As minhas amigas Maria (.Lilasdavioleta )  e Mariazita ( A Casa da Mariquinhas ) escolheram este poema como um dos mais bonitos de Manuel Alegre. Como não o conhecia e como, creio, muitos dos meus amigos do Brasil também não o conheçam, resolvi partilhá-lo.

Amigas, agradeço-vos a " dica ", porque de facto é muito bonito. Cantado pela Amália fica ainda mais belo.

Emília Pinto